terça-feira, 22 de junho de 2010

Crônica - Ano III - Nº 133 - Ideias mil, otimismo zero

Semana passada, a literatura parou para chorar a morte de um de seus mais ilustres escritores. Após uma vida longa, muitas leituras e escritos, lá se vai o velho português para um eterno descanso.

O que me chamou a atenção para cronicar a respeito desse fato foi quando li uma biografia e um resumo rápido da maneira de pensar deste literato. E também a reação de alguns amigos e da opinião pública acerca de seus escritos.

Primeiramente, falemos do pensar deste escritor. Prestemos tributo sobre algumas de suas reflexões: exemplo, o reducionismo que hoje a mídia e as pessoas estão fazendo da língua-mater, quase reduzindo-a ao grunhido, como ele bem citou. Não há como contestar seu estilo de escrever, a concisão nas ideias, a opinião que paira entre um subjetivismo peculiar e uma objetividade impressionante. Entretanto, aí mora um questionamento sobre suas ideias: o alto teor de pessimismo de seus versos. Derivado de um ateísmo raivoso, proselitista, que chegava ao ponto de falar que Deus era uma invenção para causar temor nos seres humanos e reduzir o número de filósofos, e de que o Papa é "cínico" ao defender esse Deus e não deixar o homem pensar. Também assistindo suas entrevistas, pude perceber que a visão de mundo desse autor era bastante melancólica, militante de uma linha de pensamento comunista, voltada para ideais somente palpáveis de um mundo melhor, esquecendo-se da transcendência do ser humano. Dizia que queria construir um mundo melhor: porém, da mesma forma que queria esse mundo melhor, instigava uma postura humana irritada, somente focada numa combatividade rancorosa. Bem típica do mal-humorado comunismo.

Já alguns amigos meus e a opinião pública falaram sobre "como o mundo vai viver sem ele?", "o mundo ficou mais burro". Perdeu-se um grande pensador humanista, defensor de causas como a causa palestina, os movimentos sociais, a língua. Estou com eles, nesse aspecto.

O grande problema disso tudo é quando o humanismo sobe à cabeça: um humanismo onde o ser humano seria o inventor, motivo e causa de todas as coisas, sentimentos, ações. Nada criado sem o dedo humano, inclusive aquilo que seja mais subjetivo, místico, transcendente. O velho português errou ao querer eliminar a relação entre o ser humano e sua busca pelo transcendente, praticamente inseparáveis. Por mais que seus escritos remetessem a um mundo melhor, a lutas em diversas esferas, ele errou ao justamente atacar essa capacidade e necessidade do homem de comunicar-se com algo maior. Atentar contra essa potencialidade do ser humano é dar asas a uma visão mais cinza da vida: sem valores, sem fé, sem ideais nobres, e sim ideais de militância, que nada são se faltam esse complemento do amor humano tão ligado ao transcendental.

Agora, por que tantos compraram essas ideias mil? Porque não é de hoje que uma visão mais cinzenta e materialista do mundo estampa as primeiras páginas dos jornais. É certeza de sucesso chutar virtudes e valores de berço, valorizar o que seja simplesmente monetário ou para proveito próprio, ou então atacar pessoas ou instituições que estejam contra esse mundo mais cinzento. Os defensores desse mundo cinza não admitem opiniões contra o partido ou sugestões de atuação que não estejam de acordo com a militância. Precisam de um piso onde se sustentar, e esse piso é o mundo material, sem "invenções", como ditam ser Deus.
O mundo com certeza não é um conto de fadas. Tem muita desigualdade e causas a serem descritas, como bem fez o acadêmico luso. Mas não adiantam ideias e militâncias mil, quando se falta o essencial: a verdadeira caridade, que sabe ver o homem não como um grotesco animal meramente racional, mas que pensa, ama e é ligado com algo muito maior que ele.
Descanse em paz, bom luso. Que a essas alturas está surpreso por encontrar esse Ser Maior ao qual tanto atacou, e que lhe mostrou que na verdade as ideias precisam de cores mais vivas de otimismo que o triste cinza para melhorar o mundo.
São Paulo, 21/06/2010. W.E.M.

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