quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Crônica - Ano II - Nº 67 - "O sentido do sofrer"

Começou o tempo da Quaresma. Faltam 40 dias para a Páscoa, e até lá as atenções estarão voltadas para o acompanhamento do caminho de Jesus Cristo até a Cruz, e posterior Ressurreição.

É interessante notar que em várias cidades repetiu-se um fenômeno: sai a folia do Carnaval, e entra a seriedade da Quaresma. Vi hoje no jornal um exemplo ocorrido em São Luís do Paraitinga, no Interior de São Paulo, onde exatamente à meia-noite parou-se a festa (uma das mais badaladas do Interior) e logo de manhãzinha já era celebrada a Missa da Quarta-feira de Cinzas. Muitos foliões não se esqueceram do "carnem levare" que compõe o nome "carnaval": "levem a carne", isto é, se abstiveram de carne e jejuaram, nem que fosse por algumas horas, neste dia.

Em conversa com católicos e não-católicos, muitos deles entendem a Quaresma como um período triste. Pensam que Quaresma é sinônimo de não comer, de pesadíssimas penitências, de sofrer. Aliás, muitos católicos passaram para o lado protestante ou outras religiões justamente para escapar "dessa religião que promove o sofrimento", como já ouvi uma vez.

Lamento, mas quem tem essa visão da Quaresma e do que é o sofrimento está bastante equivocado.

A Quaresma não é um período triste, muito menos promotor dum sofrimento sádico. É tempo de reflexão: refletir sobre Jesus, que não poupou sangue e esforços para abrir-nos o Céu e redimir nossos pecados. Refletir sobre a Cruz, sinal do cristão, que está presente a cada dia que nasce em nossas vidas. E o convite que nos é feito para acompanhar Jesus no caminho até a Cruz nestes 40 dias prevê, na medida do possível, acompanhá-lO imitando-O nem que seja um pouquinho.

Aí entra o tal do sofrimento. O sentido cristão do sofrimento não é vê-lo como um castigo. O sofrimento para o cristão é penitência grata a Deus, oferecida pelas mais diversas intenções (família, amigos, etc.). 

E que sofrimentos seriam esses? Jejuns, batidas no peito, choro? Nada disso. O sofrimento é aquele que está embutido em nosso dia-a-dia: um ônibus que atrasa ou nos "deixa falando" no ponto, uma noite mal-dormida, uma comida não tanto agradável que mamãe preparou, uma contrariedade na faculdade ou no serviço, entre muito mais. Cada dia nosso está repleto de situações que faríamos o possível por evitar, e resmungamos cada vez que acontecem. Pois bem, a visão cristã do sofrimento propõe não fugir de tudo isso, mas encarar essas situações com serenidade. Muitas vezes sorrir ou concentrar-se no estudo ou trabalho custa muito mais que quatro dias seguidos de jejum ou um mês inteiro sem comer carne.

Podemos somar a isso outro fato: muita gente faz penitências muito mais pesadas com um intuito muito simples: servir-se a si mesmas. Quantas pessoas não passam horas a fio na malhação ou no bronzeamento artificial, para ficarem mais "saradas"? Quantas meninas ficam 20 horas sem comer simplesmente para não ganharem 250 gramas e ficarem "gordas"? Quantos senhores e senhoras de idade gastam uma baita grana e tomam um coquetel com uns 20 remédios para apagarem rugas e cabelos brancos? E por aí vai! Então, por que não fazer boa cara para essas dificuldades e sofrimentos que virão bater à porta, e oferecer essa ocasião pela recuperação da saúde de um amigo, pelos colegas de trabalho, pela família, ou simplesmente para dizer: "Jesus, aqui está minha parte nesse caminhar até a Cruz, que para Ti foi tão sofrido"?

Meus caros, não façamos cara feia para a Quaresma. Convido a todos para refletir muito sobre esse tema, e pensar: até mesmo o sofrimento desse mundo atual é egoísta! Por que não, então, convertê-lo em coisa boa, ao invés de ficarmos carrancudos?

Se assim o fizermos, tenhamos certeza: Cristo ficará muito contente por ter nossa companhia nesse árduo caminho até o Calvário. E daremos o verdadeiro significado ao sofrer: alegria.

São Paulo, 26/02/2009. W.E.M.

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