domingo, 19 de abril de 2009

Crônica - Ano II - Nº 74 - "No meio do caminho tinha uma pedra..."

"(...) tinha uma pedra no meio do caminho". Inspiro-me na famosa poesia de Carlos Drummond de Andrade, e também no feriado de Joaquim José da Silva Xavier, ou vulgo Tiradentes, pra escrever esta crônica.

Nesta semana, na já tradicional roda de amigos da rampa da Geografia-USP de toda santa noite, uma das pessoas comentou que seu dia tinha sido nada bom, literalmente "uma merda". Pegação no pé por parte do chefe ou dos colegas, correria pela pontualidade, estudo intenso, cansaço, sono atrasado, e por aí vai.

De fato, quem não passa por isso nos dias comuns? Ainda bem que estamos num mês que os feriados resolveram pintar pra aliviar essa tensão (Tiradentes, esta semana, e recentemente a Páscoa - logo mais o Dia do Trabalho, hahahaha).

Olha, conforme Drummond brincou na poesia, no meio do nosso caminho haverão pedras, todos os dias, de diversas formas. E cabe a nós decidirmos se vamos nos deixar tropeçar e chorar nelas a cada pôr-do-sol ou quando vamos deitar-nos.

Não é fácil. Conforme tantos dizem (e eu também digo), ninguém tem "sangue de barata". Podemos explodir seja com grave intensidade, seja de forma mais reservada, e em alguns casos com razão. Mas o que podemos treinar dia após dia é diminuirmos o risco de explosão dessa nitroglicerina que trazemos conosco.

E mais: cada dia é um aprendizado. Hoje persiste uma mentalidade de que o erro ou dificuldade é ruim, fatal, triste, e descobri-los é pior ainda. Não é assim. Quantas vezes, diante de terríveis dificuldades, não ganhamos impulso para revertê-las em vitórias esmagadoras? Ou então, quando descobrimos um erro ou defeito nosso, ganhamos a luz necessária para corrigir a rota da barca de nossas vidas, pois antes ninguém nos tinha falado sobre esse detalhe chato de nossa parte? Aprendemos cada dia a vencer-nos e tirarmos mais de nós mesmos. Superamo-nos.

Agora, se optarmos por um caminho ranzinza, que não admite a presença de errinhos por mínimos que sejam, a queda e os machucados são maiores. Tem gente que, quando recebe uma patada dessas que a vida nos dá, comporta-se igual ao moleque que vi uma vez num parquinho desses, quando um menino lhe deu um drible com sua própria bola: "não brinco mais!". Ou então se tranca no quarto e de lá não sai, bancando o mimado e chorando lágrimas de crocodilo até alguém ceder aos seus caprichos.

Estamos sempre na berlinda, e cair é próprio do ser humano. E Deus então fica rindo da nossa cara, dizendo: "hahahah, vai cair... caiu, fracote"? Nada disso: devemos saber levantar logo do tropeço, por mais que seja difícil, e recomeçar sempre. SEMPRE. Não faz parte da dignidade do ser humano jogar a toalha: quem o faz está indo contra a natureza humana e contra uma das principais virtudes, a esperança. E se Deus permite nossos tropeções ou inferno astral (como acontecu com o goleiro de meu Tricolor), é porque sabe que temos embutidos em nós esse dom de ressurgir a cada momento, tal qual a fênix.

Assim, que tal mostrarmos que somos fortes e sabemos aguentar os bofetões que a vida nos dá diariamente? Mais do que isso: mostrar que aprendemos e tiramos vida da correria e sobes-desces diários e chutamos essas pedras do meio do caminho, com direito a "embaixadinha"??? 

Isso, esteja certo, nos fará ser tão mártir quanto Tiradentes o foi, só que com uma diferença: seremos mártires vivos. Mas tão heróicos quanto o Mártir da Independência do Brasil, que lembramos neste 21/04. E as "merdas" de dia virarão poderoso adubo para nosso jardim de conquistas e vitórias!

São Paulo, 19/04/2009. W.E.M.

4 comentários:

disse...

Wanderlei!
Hum... eu acho super bacana esse seu 'otimismo constante' e concordo que é preciso sempre jogar essa pedra pra longe (com direito a embaixadinha é melhor ainda!). Mas sabe que eu não creio que existam muitas pessoas que só se lamentem e não 'brinquem mais'. Todo mundo tem seus dias ruins e, às vezes, é difícil encarar. Mas desistir pra sempre, duvido...
Como vc disse, todo mundo passa por coisas ruins. E eu acho que temos que explodir de vez em quando sim. Sabe, se a gente não explode aos poucos, no dia que explodir de vez não tem volta.
=(
Ir 'guardando' coisas ou levando tudo 'numa boa' não vai, na minha opinião, adiantar nada.
=/
Acho que momentos deprê no quarto, brigas e discussões ou ainda mandar o chefe praquele lugar é válido. Não como rotina, não como solução, mas como parte da construção do caminho, da vida mesmo.
Beijos e ótimo feriado!
=)

disse...

Esqueci de falar!!
Drummond é meu favorito.
=)

Prof. Wanderlei Evaristo de Mattos disse...

Oi, Mô!

Olha que tem, viu... Vide o aumento do número de casos de depressão e suicídios em nosso país e pelo mundo, com mais e mais pessoas tomando remédios para não se entregar de vez. E o pior: tem gente que esconde esse "não brincar mais" no consumismo, no workaholic, na bebedeira, e por aí vai.

Não falei aqui que não vamos explodir. Inclusive comentei numa das linhas que essas explosões virão. O que podemos fazer, isso sim, é diminuir a nitroglicerina.

Apesar disso, não acho válido dar margens para qualquer perda de paciência, por mais que elas possam acontecer. Se elas aparecerem que funcionem, como você disse, como construção do caminho. Agora, não se pode admitir elas como o normal da balança. O normal é, sim, a paciência. Não a muda, mas aquela que, em vez de apelar pra crises nervosas, prefere refletir e conversar.

Uma explosão pode ser estopim para uma sucessão de outras. Ou, mesmo que não seja, entorpece de alguma forma o nosso caráter e torna mais vulnerável nossa personalidade. Daí a necessidade de afogá-las com paciência.

E tudo isso não é guardar ou levar numa boa,como vc diz. Quem simplesmente leva na boa é pusilânime, indiferente. Ser paciente é saber chutar as pedras, mas ao mesmo tempo sabendo devolvê-las ao dono com uma resposta que faça o dono dessas pedras pensar duas vezes ao colocá-las no meio do caminho. Já pensou se o lavrador, ao primeiro ataque dos corvos a plantação, chutasse o balde e mandasse os corvos praquele lugar e ficasse nisso? Pelo contrário: ele vai lá, calmamente, replanta tudo o que os corvos comeram... e dessa vez, coloca um espantalho. O paciente age, mas em silêncio.

Portanto, a construção de um caminho eficaz da vida começa pela paciência. E, quando vierem as impaciências (material ruim), reciclamo-as em matéria boa.

Bjos, e bom feriado pra vc também!
Wanderlei

André Henriques disse...

Você está certo, meu caro!

Mas pense no seguinte, por vezes, é preciso falar a verdade. A questão da nitroglicerina me lembrou um texto que escrevi em agosto do ano passado.

Nele eu digo a sinceridade funciona como essas bombas. Sair brigando, descontando suas frustrações nos outros é o pior caminho sempre. Mas nem por isso devemos encobrir certos fatos, devemos sempre colocar acima de tudo a verdade, mesmo que isso possa causar alguns desgastes nas relações. Até porque relações que não resistem às verdades, talvez não tenham sido formadas pelos sentimentos mais verdadeiros.

Claro que tudo com muita calma e paciência. Mas é fato, às vezes, nossas hemácias produzem nitroglicerina e falamos o que pensamos a torto e a direito. Nesses momentos é precisamos nos retirar de cena para deixar a paz voltar.